Etanol: megaempresas, trabalho escravo e responsabilidade social

Blog do Sakamoto

, por SAKAMOTO Leonardo

A ETH Bionergia, pertencente ao Grupo Odebrecht, anuncia hoje o acordo de união com a Brenco, criando umas das maiores empresas do setor sucroalcooleiro no país, capaz de, em três anos, produzir 3 bilhões de litros de álcool. O setor continua se consolidando – ou se concentrando, dependendo do ponto de vista. No início deste mês, a Cosan (a maior empresa de açúcar e álcool do mundo) e a Shell também se uniram para garantir distribuição nacional e internacional do combustível. Mas o paralelo entre ambos os casos não está apenas no tamanho do negócio e sim em casos de exploração do trabalho envolvendo ambos.

A Cosan ganhou manchetes dentro e fora do país quando foi incluída na “lista suja” do trabalho escravo em 31 de dezembro passado devido à libertação de 42 pessoas em sua usina em Igarapava (SP). Até obter uma liminar na Justiça do Trabalho, retirando-a provisoriamente da relação, viu o BNDES, o Wal-Mart, entre outras empresas, suspenderem o relacionamento com ela, além de quedas significativas nas bolsas de valores de São Paulo e de Nova Iorque.

A Companhia Brasileira de Energia Renovável (Brenco), por sua vez, teve 17 trabalhadores libertados da escravidão em Mineiros (GO) em 2007. E para não entrar na “lista suja” e sofrer a mesma dor de cabeça que a Cosan (lembrando que a Petrobras e outras distribuidoras têm sido céleres na suspensão de compras de usinas na “lista suja”), a Brenco conseguiu em maio de 2009 um mandado de segurança para que seu nome não fosse incluído na relação. Esse tipo de ação não é uma novidade, uma vez que, desde o lançamento da lista em novembro de 2003, empregadores vêm se utilizando de diferentes tipos de ações judiciais para não ser incluído nessa lista usada pelo mercado para embargos.

O Ministério do Trabalho e Emprego informou que está recorrendo, em conjunto com a Advocacia Geral da União, das decisões tanto no caso da Cosan quanto no da Brenco, com o objetivo de poder devolver a primeira à lista e incluir a segunda.

Na época da libertação dos 17, em nota de esclarecimento, a Brenco “lamentou que falhas tenham ocorrido e assume suas responsabilidades”. Também enumera as modificações feitas e elogia a atuação do grupo móvel. “Inspeções como as do Ministério do Trabalho, sem dúvida, contribuem para que a Brenco possa aprimorar as práticas de valorização de sua mão-de-obra e de qualidade de produção, garantindo a inserção do etanol do Brasil nos mercados internacionais”, afirmou a nota.

Por que lembrar dessa informação logo agora neste momento festivo pela confirmação de uma nova parceria? Jogar água na comemoração alheia? Longe disso. Este é apenas um serviço de utilidade pública, uma vez que investidores e o mercado têm o direito de terem acesso a uma radiografia das empresas, incluindo passivos trabalhistas pendentes. O sistema de análise de risco do capitalismo brasileiro consegue fazer belas avaliações sobre a capacidade comercial e financeira de empreendimentos, mas ainda engatinha quando o assunto são problemas socioambientais. Muitos esquecem que a sustentabilidade de um negócio será cada vez mais medida pela adoção de critérios reais de responsabilidade social e não apenas pelas doações entregues como investimento social privado. Ou seja, orientar os rumos da empresa para que não cause danos à sociedade e, consequentemente, não agregue desgraça à sua marca. E se, hoje, são poucos os que conseguem fazer esse tipo de análise de risco, é menor ainda o número daqueles que se preocupam com os resultados do próprio comportamento.

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