O desmatamento, da floresta amazônica em particular por suas dimensões, e as mudanças no uso do solo, decorrentes, sobretudo, do avanço avassalador da agropecuária industrial são a principal fonte de emissões de CO2, de metano (pela fermentação digestiva dos animais na pecuária e pelo cultivo de arroz) e de óxido nitroso (pelo processo de cultivo dos solos cultivados e pelos dejetos da pecuária) no Brasil.
Os dados globais trazidos pela ONG Grain são significativos: eles informam que a maioria dos estudos já realizados situa uma contribuição das emissões do setor agrícola, produzidas especialmente a partir do cultivo, da ordem de 11 a 15% em relação ao montante de emissões mundiais. Porém, somando toda a cadeia agro-industrial (que inclui além do uso direto do solo, também o desmatamento, o processamento e transporte dos alimentos, o desperdicio, etc) os dados da Grain revelam que:
“el sistema agroalimentario global actual, impulsado por una poderosa industria alimentaria transnacional, es responsable de cerca de la mitad de todas las emisiones de gases con efecto de invernadero producidas por humanos: una cifra entre un mínimo de 44 % y un máximo de 57%”. [1]
Vê-se que a forma de ocupação do solo no campo e o tipo de agricultura predominante no país contribuem significativamente para o efeito estufa. Em retorno, as mudanças climáticas terão possivelmente um efeito severo sobre a produção de alimentos no país e no mundo, acabando com certas produções em certas regiões e mudando as áreas de produção. Segundo o estudo Aquecimento Global e a Nova Geografia da Produção Agrícola no Brasil, realizado em 2009 pela Embrapa e Unicamp, [2] as mudanças do clima poderão ser tão intensas a ponto de mudar a geografia da produção agrícola nacional. O nordeste, principalmente, terá grandes perdas enquanto a produção no sul poderá crescer. Essas mudanças produzirão, sem dúvida, problemas de abastecimento para as cidades.
A crise alimentar que se anuncia terá também como ingredientes a erosão da agrobiodiversidade e o domínio das sementes pelas grandes empresas. A aposta é que sementes modificadas geneticamente, a despeito dos riscos a saúde e ao meio ambiente, apontados recentemente por mais uma pesquisa sobre o milho transgênico, [3] permitirão enfrentar essas mudanças climáticas. Mesmo que essas previsões estejam acertadas, a alimentação se tornará mais dispendiosa, já que o custo das sementes industrializadas, geneticamente modificadas e seguramente patenteadas, será controlado pelas empresas, ameaçando a autonomia dos agricultores e a própria diversidade dos alimentos e da biodiversidade no planeta.
Em muitas cidades, o abastecimento de água já representa um problema. O modelo de agricultura por si já prejudica os cursos de água, por contaminá-los com resíduos de agrotóxicos, consumir uma grande quantidade de água para irrigação, provocar assoreamento e reduzir os fluxos pelo desmatamento, em especial em áreas de nascentes e matas ciliares. Isso contribui para tornar as enchentes mais devastadoras e as secas mais severas. Esses problemas serão agravados e, se não forem enfrentados, comprometerão, em quantidade e em qualidade, o abastecimento de água das cidades, sendo previstos o incremento do custo de tratamento da água e a incidência maior de doenças relacionadas à água. A atual seca no Nordeste já faz com que Maceió esteja submetido a racionamento.
Não só os rios ameaçam as cidades, mas o mar. O furacão Catarina no litoral sul brasileiro em 2004, e os furacões que devastaram New Orleans, em 2005, e a costa leste dos EUA, em 2012, representam um sinal de alerta para as grandes cidades e metrópoles situadas no litoral quase ao nível do mar. Aliás, durante a COP 18, foi divulgada pela agência de notícias AFP uma pesquisa, onde se anuncia que:
“a elevação do nível do mar provocada pelo aquecimento global tem ocorrido 60% mais rapidamente do que o estimado em 2007 pelo grupo de climatologistas da ONU, o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC)”. [4]
Uma notícia da Folha de São Paulo de 30 de novembro de 2012 informando sobre esse estudo precisa:
“Simulações de computador que tentam prever o aumento total do nível do mar até 2100 em razão do aquecimento global variam radicalmente. O último relatório do IPCC trabalha com uma variação entre 20 cm e 60 cm, mas previsões recentes mais sofisticadas indicam que o nível do mar pode subir de 75 cm a 1,85 metro neste século”. [5]
Enfim, após essas décadas de migração para a cidade – produzidas tanto pelo apelo a uma vida melhor quanto pela escolha pelos detentores do poder de um agricultura que não prevê lugar para o campesinato – a expulsão do campo do que sobrou de população rural poderá se concluir, dessa vez, por motivos climáticos. É o que aponta, por exemplo, estudo realizado em 2009 que avalia que “entre 2030 e 2050, (haverá) aumento significativo (até 24%) na taxa de migração das áreas mais carentes para os grandes centros urbanos do Nordeste e de outras regiões”. [6]