Formation des instituteurs pour une autre éducation infantile

Literatura infantojuvenil: modos de ver, modos de ser

, por HANNING Rona

A proposta do trabalho com Literatura Infantojuvenil dentro da vertente de Artes foi fundamentalmente promover uma ruptura de padrões previamente estabelecidos, muito comumente construídos dentro da escola, em que os paradigmas do belo/feio fincam estacas difíceis de serem removidas.

Então, busquei oferecer um espaço de reflexão e vivência com a literatura infantojuvenil a fim de gerar inquietações e descobertas para as diversas formas de ler palavra e imagem. Fazer com que as leituras transcendessem a linearidade esperada por adultos e alcançassem a flexibilidade do pensamento livre de uma criança, que pode e deve desviar da lógica óbvia cujo raciocínio precisa definir, em linha reta, o que aconteceu, onde aconteceu e com quem aconteceu aquela história contada.

Para tanto propus exercícios de olhar e ver com o auxílio de novas linguagens estéticas instigando o diálogo e a reflexão através de leituras individuais e compartilhadas e, ainda, trocando as múltiplas avaliações a respeito das obras selecionadas. A seleção de títulos foi toda baseada no intuito de apresentar modos de narrar uma história sob diferentes intervenções, seja pela forma ou pelo conteúdo, ou mesmo pelos dois, cujo maior ganho seria apresentar soluções criativas para questões humanas com as quais todos convivem.

Neste percurso, o grupo de professoras se deparou com obras conhecidas e desconhecidas que apresentavam uma nova proposta de contar e recontar histórias, falar sobre o mundo sob as mais variadas perspectivas. Hora em que o conceito de picturebook ou álbum ilustrado traz uma nova forma de olhar para os livros que têm passado pelas mãos de crianças e adultos e têm sido tão pouco compreendidos.

A ilustração da literatura pode ser uma nova forma de ressignificar o poder da imagem, atribuindo a esta um sentido próprio, dando significado à autoria do leitor. À medida que lemos uma história e que a narrativa possui um personagem, damos a este uma cara, uma imagem, uma forma. A ilustração pode ou não confirmar aquilo que o leitor imaginou e viu. Quando confirma (e isso acontece apenas às vezes), sentimos um conforto único, existente apenas na dimensão artística. Mas, quando nega a imagem que construímos previamente, pode causar repúdio. E isso também pertence exclusivamente ao universo da arte, mais especificamente ao da literatura.
Podemos nos sentir tão próximos de um personagem a ponto de inseri-lo na nossa vida e aprender com ele.

Exatamente pelo componente criativo e multifacetado da ilustração, pelas inúmeras possibilidades de referenciais que as imagens de dentro de uma história podem trazer, é que entendo a importância desta linguagem para o pensamento criativo. E, além dela, trazer o olhar dos professores para a linguagem do livro como um todo, considerando a palavra, a imagem, o formato, o tamanho e a paleta de cor utilizada naquela narrativa.

Assim como em uma orquestra, a beleza da obra está na harmonia encontrada entre todos os seus componentes.

Assim, na apresentação dos livros, o grupo vivenciou experiências diversificadas de leitura literária. No círculo de leitura fizemos um diálogo sobre as obras e relfetimos acerca das questões narrativas e estéticas.

Na trilha da literatura, com algumas obras...

Foram vários os livros analisados e discutidos em sua diversidade. A partir do livro Tinha uma velhinha que engoliu uma mosca de Jeremy Holmes, foi possível apresentar um texto latino de tradição oral que trata da questão da morte com humor, modificando a perspectiva mais habitual de lidar com isso apenas como uma temática extremamente delicada. A ilustração provoca com cores soturnas uma narrativa absurda.

Com o livro Anturo de Davide Cali e Ninamasina, história contada pelo cachorro que foi abandonado pelo dono, pudemos conhecer uma história contada através de fotografias, logo do aspecto real acerca do impossível. Neste livro, a narrativa assume a fidedignidade através das imagens apesar de as palavras remeterem ao imaginário.

Já com a obra Zoo de João Guimarães Rosa e Roger Mello, temos um livro dentro de uma perspectiva completamente distinta daquilo que imaginamos. Não há linearidade nem tampouco uma história a ser contada, apenas recortes de definições poéticas, rebuscadas, que fogem das definições-padrão atribuídas aos animais do zoológico.

O livro Não vou dormir de Christiane Gribel e Orlando nos mostrou como narrar com imagens às vezes pode ser bem mais impactante do que contar através de palavras. Na história o ilustrador encontra uma forma própria ao mostrar uma criança com sono e que não quer dormir. Cena cotidiana contada criativamente e que faz a gente repensar as muitas maneiras de falar do corriqueiro.

Com a leitura de Ed Emberley Vai embora, grande monstro verde! descobrimos que o medo é uma construção e que por isso pode ser desconstruído. Este livro mostra isso não apenas no texto, mas também na forma como conta a história deste monstro verde que surge, mas que também pode ir embora se assim quiser o leitor.

Em contato com o livro de Charlotte Gastaut A grande viagem da Senhora Prudência fomos percebendo que ler imagens pode ser mais difícil do que ler palavras. Esse texto imagético requer atenção e encadeamento de um raciocínio pouco exigido pelos leitores, mas de fundamental importância. Através de cores e formas fascinantes, a ilustradora-autora exige ao mesmo tempo uma leitura concentrada e divertida, cheia de riquezas estéticas.

Com o livro de Madalena Matoso Todos fazemos tudo foi possível montar e desmontar; pode ser isso mas também aquilo. Os diversos papéis que podemos assumir todos os dias, as mudanças culturais, sociais que podemos fazer. Como num jogo de encaixe, a ilustradora portuguesa apresenta as inúmeras possibilidades das funções humanas.

Moreau Laurent com sua obra ¿En qué piensas? nos permitiu descobrir as tantas coisas que podemos guardar na cabeça, que quem vê cara não sabe o que cada um está pensando porque somos donos do nosso pensamento e ele nos pertence. Será?

Com o livro O invisível de Alcides Villaça e Andrés Sandoval inventamos estratégias para tornar a leitura mais complexa, instigante e original. No livro, autor e ilustrador compõem com unidade e maestria uma obra literária que surpreende o leitor de qualquer idade.

Também Roger Mello com Meninos do Mangue nos deu a possibilidade de recontar o grande poeta João Cabral de Melo Neto, o que não é um desafio muito simples. Menos ainda quando pretende alcançar público de diferentes idades trazendo a arte do lixo para as suas ilustrações como forma de somar a linguagem plástica à poética. Ou quem sabe entender que ambas formam uma única?

Abra este pequeno livro foi a obra de Suzy Lee, que nos mostrou que caber sempre cabe. Uma história sempre pode nos levar a uma outra que leva a outra e assim por diante. Mas será que isso acontece sem que haja provocação? Isso não seria formação do leitor?

Angela Lago com ABC Doido nos ajudou a perceber que responder ou perguntar sempre são tarefas difíceis quando usam o melhor da inteligência. Atribuindo um valor precioso a cada letra do alfabeto, Angela Lago brinca com coisa séria e deixa nas entrelinhas o recado de que por trás de cada charada há muito o que conhecer.

Por fim com o livro Ismália de Odilon Moraes pudemos tornar à poesia contemporânea do início do século XX através da forma como ela será contada. Este foi o grande desafio deste ilustrador: inovar o modo de ler e compreender em que a forma e o conteúdo estão entrelaçados a tal ponto que o leitor experiencia corporalmente o movimento da personagem.

Após o trabalho com o grupo, depois das leituras, reflexões e debates acerca do desdobramento dos livros em cada uma das professoras, houve o compartilhamento de ideias e sugestões de como poderiam desenvolver as múltiplas formas de ler em suas salas de aula.

Através da troca, foram descobrindo juntas o quanto mais poderiam fazer para trazer a leitura literária para perto delas, em primeiro lugar, e depois para junto dos alunos. Perceberam que iniciá-los na trajetória literária seria bem mais do que contar histórias ao final do dia, dramatizar ou inventar novos finais para as narrativas. Formá-los leitores em literatura dependia bastante de qual obra apresentar e com qual dose de afeto e encantamento as professoras traziam os personagens para a vida das crianças. Pois são eles, os personagens, que modificam tudo em nosso imaginário. Animais, seres fantásticos ou simples humanos que dentro da ficção permitem a cada leitor ver a vida sob outra perspectiva, ampliar seus referenciais e horizontes e construir, a partir daquela leitura, o mundo descoberto e desejado.

A literatura, assim, deixa de ser apenas o território da imaginação e do faz-de-conta para configurar-se no terreno fértil do possível, daquilo que cada um de nós pode criar.

Commentaires

Referências :

  • EMBERLEY, Ed. Vai embora, grande monstro verde! Brinque Book, 2009.
  • GASTAUT, Charlotte. A grande viagem da senhora Prudência. Ática, 2011.
  • GRIBEL, Christiane & Orlando. Não vou dormir. Global, 2007.
  • LAGO, Angela. ABC Doido. Melhoramentos, 1999.
  • LEE, Suzy. Abra este pequeno livro. Cosac Naify, 2013.
  • MATOSO, Madalena. Todos fazemos tudo. Planeta Tangerina. 2011.
  • MELLO, Roger. Meninos do Mangue. Cia das Letrinhas, 2001.
  • MORAES, Odilon. Ismália, Cosac Naify, 2006.
  • MOREAU, Laurent. ¿En qué piensas? Kókinos, 2011.
  • ROSA, João Guimarães; MELLO, Roger. Zoo. Nova Fronteira, 2008.
  • VILLAÇA, Alcides; SANDOVAL, Andrés. O invisível. Editora 34, 2011.

Contexto de Produção: Texto produzido como registro da disciplina ministrada no Curso de Extensão em Educação Infantil da UNIRIO.

Produtor - contato: cei.unirio@gmail.com